Há alguns anos fiquei presa em um ônibus cruzando a cidade de São Paulo durante a hora do rush.
O tráfego mal estava se movendo. O ônibus estava cheio de pessoas frias e cansadas que estavam profundamente irritadas umas com as outras, com o próprio mundo.
Dois homens
latiram um para o outro sobre um empurrão que pode ou não ter sido
intencional. Uma mulher grávida subiu e
ninguém lhe ofereceu um assento. A raiva
estava no ar. Nenhuma misericórdia seria encontrada ali.
Quando o ônibus
se aproximou da avenida Paulista, o motorista pegou o interfone e anunciou:
Foi como se um
feitiço tivesse sido dissipado.
Todos começaram a
rir. Os rostos brilharam de surpresa e
deleite.
Pessoas que
vinham fingindo na última hora não perceberem a existência um do outro, de
repente, estavam sorrindo um para o outro. “Esse cara está falando sério?”
Ele estava
falando sério.
Na próxima
parada, conforme prometido, o motorista estendeu a mão com a palma para cima e
esperou.
Um por um, todos
os passageiros que saíam, colocaram suas mãos logo acima da dele e imitaram o
gesto de deixar algo cair em sua palma.
Algumas pessoas
riram enquanto faziam isso, outras choravam, mas todas fizeram.
O motorista
também repetiu o mesmo adorável ritual na próxima parada.
E na próxima.
Em todo o caminho
até o rio.
Vivemos em um
mundo difícil, meus amigos.
Às vezes, é
extremamente difícil ser um ser humano.
Às vezes, você
tem um dia ruim.
Às vezes, você
tem um dia ruim que dura vários anos.
Você luta e
falha.
Você perde
empregos, dinheiro, amigos, fé e amor.
Você testemunha
eventos horríveis acontecendo no noticiário e fica com medo e retraído.
Há momentos em
que tudo parece envolto em trevas.
Você anseia pela
luz, mas não sabe onde encontrá-la.
Mas, e se você
for a luz?
E se você for o
próprio agente de iluminação que uma situação escura implora?
Isso é o que este motorista de ônibus me
ensinou, que qualquer um pode ser a luz, a qualquer momento.
Esse cara não era
um grande jogador de prestígio.
Ele não era um
líder espiritual.
Ele não era um
influenciador experiente nas mídias.
Ele era um
motorista de ônibus, um dos trabalhadores mais invisíveis da sociedade. Mas ele possuía poder real e o usou
lindamente para o benefício daqueles que o cercavam.
Quando a vida parece
especialmente sombria ou quando me sinto particularmente impotente em face dos
problemas do mundo, penso neste homem e me pergunto:
“O que posso
fazer agora para ser a luz?”
Claro, eu não
posso encerrar pessoalmente todas as guerras, ou resolver o aquecimento global,
ou transformar pessoas irritantes em criaturas totalmente diferentes.
Eu
definitivamente não consigo controlar o tráfego.
Mas eu tenho
alguma influência sobre todos que encontro, mesmo que nunca falemos ou
aprendamos o nome um do outro.
Não importa quem
você seja, ou onde esteja, ou quão mundana ou difícil sua situação possa
parecer, eu acredito que você pode iluminar o seu mundo.
Na verdade,
acredito que esta é a única maneira pela qual o mundo será iluminado, um
brilhante ato de graça de cada vez, até o rio.
Texto de Elizabeth Gilbert
Adaptado por Lia
Silva